segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Uma questão de 'natureza'


Existem inumeráveis tipos de personalidades. Todas com pronunciadas diferenças entre si. Entretanto, algumas características em comum podem ser agrupadas de forma a se estudar, com razoável segurança, os grupos e subgrupos humanos. De certa forma é o que faz a Psicologia Social, ciência relativamente nova, que parece tentar integrar elementos da Sociologia aos da Psicologia.
Assim como em todas as demais ciências, o agrupamento facilita a classificação, e esta, objetiva a facilitação do estudo, do entendimento.
Num rápido exercício de análise, ainda que sem qualquer fundamentação científica, é possível depreendermos de nossos parcos círculos sociais, alguns agrupamentos compostos por pessoas de características assemelhadas. Há os tímidos, os intrépidos, os ‘descolados’, os estudiosos, os reflexivos... enfim, uma miríade de tipificações.
Dentre essas, há um ‘tipo’ que reputo particularmente interessante. Não os definirei. Descreverei suas características, a priori. E sequer ater-me-ei em demasia nesse labor, pois prefiro tentar lançar luz sobre a intelecção das causas e efeitos de tais caracteres.
Algumas pessoas costumam mostrar peculiar aptidão para dividir com terceiros elementos da vida alheia. A primeira imagem que se nos forma à mente é a dos ‘fofoqueiros’. Mas não me refiro somente a esses. Há diversos níveis de acometimento dessa compulsão. Há aqueles que ‘dividem relatos’ somente dos ‘fatos de maior relevância’ – coisas realmente interessantes, picantes, impactantes. Há aqueles, ainda, que se utilizam dessa praxe sob pretexto de estabelecer vínculos. Ganha-se confiança de terceiro confidenciando-lhe ‘segredos’ que ‘não seriam revelados a mais ninguém’.

Aqui, já se percebe certa venalidade. Além expor intimidades de outra pessoa a alguém, tenta-se fazer crer ao interlocutor que tal ato é prova de confiança, intimidade. Este, normalmente desavisado, acaba por aceder, anuindo com o fato e, por vezes, dependendo de sua natureza, aderindo à prática. Angaria-se, então, com isso, solidez, confiança, elementos de estabilização relacional.
Há, no entanto, algo de incongruente nessa prática, que fica, normalmente, subjacente ao ‘tapete’ da relação, e, por isso, passa despercebido na maioria das vezes.
Vejamos: não lhe parece estranho utilizar, como elemento aglomerante de uma relação, prática de natureza desagregadora? Afinal, desde tempos imemoriais, ‘falar da vida alheia’ constitui prática condenável que, se descoberta pela vítima do ato, costuma causar mal-estar, desavenças, etc.

Então, em última análise, utiliza-se uma prática capaz de causar afastamento, repulsa, para ‘aproximar’ pessoas? Não seria isso um sinal de patologia da relação?
Mais que isso, o indivíduo que se utiliza de tais expedientes, normalmente é taxado de ‘fofoqueiro’o que não constitui prática honorífica – ao contrário, é, normalmente, condenado socialmente tal comportamento. Então se utiliza de atitude condenável para cimentar relações?
Bem, por óbvio, o interlocutor do agente que ora estudamos, ao anuir com tal práxis, podemos supor, incorre em uma de duas possibilidades: ou assume postura semelhante (e aí nada temos mais a dizer, uma vez que excetuando-se na Física, semelhante atrai semelhante!), ou, desavisadamente, incorre no erro de acreditar que tal atitude constitui, mesmo, prova de confiança - algo do tipo: “ele (ou ela) só me conta essas coisas porque confia em mim!”.
Aqui, a inocência é abastecida pela vaidade: quer-se, anseia-se por ser especial, único, importante. Assim, adoça-se o ego com a idéia, mesmo inconsciente, de que se é (e sempre será!) o único merecedor de tais confidências.
Essa “inocência egoísta” tem um preço – como, aliás, tudo na vida! A credulidade faz baixar as defesas, diminui as reservas, aumentando a vulnerabilidade.
Mas o maior tributo a ser pago pela inocência ainda está por vir.
Alerta-nos Diderot: “Quem te fala dos defeitos alheios, com os outros falará dos teus”. A vaidade egoísta que faz com que se acredite ser ‘o único’, cega para o fato óbvio que se depreende desta sábia advertência emitida na França do século XVIII.
Não se iluda: as atitudes emanam da natureza das pessoas. O que elas fazem hoje, repetirão amanhã, porque essa é a sua natureza. Assim como o escorpião da fábula, ainda que isso lhe cause a morte, não se deixará de cravar o ferrão nas costas do diligente sapo. É só uma questão de tempo e oportunidade.
Não é por mal... é apenas a natureza! Essas foram as últimas palavras daquele pobre bicho que precipitou, indiretamente, sua morte no rio. E elas foram ditas com sinceridade!



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