quarta-feira, 18 de julho de 2012

O "ANIMUS DOMINI", O "TUDO OU NADA" E A INFELICIDADE ORGULHOSA


Conversando com minha amiga Kátia Alessandra sobre algumas "incongruências relacionais" que acometem casais e ex-casais, levantei alguns questionamentos acerca de tais "paragens" e engajei-me na persecução de respostas. Gostaria de compartilhar algumas de minhas conclusões, muitas delas alcançadas com a ajuda daquela valorosa manceba!
O ponto central do questionamento reside no fato largamente observável de que "casais" - sejam de esposos, namorados, amantes - ao se separarem, independente do motivo, parecem cumprir, invariavelmente, um lamentável roteiro - quase um ritual! - deplorável de mútua agressão (física, verbal, ou apenas velada), de forma a, no mais das vezes, tornarem-se inimigos ou, no mínimo, ignorarem-se e se evitarem mutuamente.
Aí cabe um questionamento: desde que não tenha havido um indelével processo de desgaste fundado em atitudes desrespeitosas, o que justificaria tal fato?
É óbvio que, em tendo havido longo e penoso processo desagregatório, geralmente baseado em agressões verbais e imputação de mágoas, não se há de esperar que um "ex-casal" nutra sentimentos recíprocos de respeito e gratidão e o melhor que têm a fazer é evitarem-se mutuamente.
Mas é sobre o outro grupo que eu quero centrar minha análise.
Vejo casais se desfazerem - e isso é "moda" e será cada vez mais pela própria natureza humana! - todos os dias. Mas o que eu não compreendo é a forma como se tratam após o "fato consumado".
Vejo pessoas que compartilharam sonhos por anos, que se doaram e receberam mutuamente, que se ajudaram e ampararam, de repente tratarem-se como se fossem "estranhos" um ao outro - o que me causa espécie!
O motivo da minha indignação é o acinte ao racionalismo que tal atitude representa.
Analisemos.
Você ignora, normalmente, um estranho - alguém que nada lhe acrescenta. Ainda a esse, você dispensa respeito e alguma consideração civilista.
Se alguém te trata com certa cortesia, a menos que você seja um ignorante ou arrogante, você o retribuirá. Se alguém se mostra cooperativo, acrescenta-lhe coisas boas, você mostra gratidão e busca retribuir. E se alguém lhe contribuiu para o seu crescimento, cuidou de você, demonstrou alguma vez enorme carinho, você lhe será sempre grato(a), ainda que não mais se encontrem, ou o façam raramente. Mas se alguém fez tudo isso e muito mais, dividiu lençóis e planos contigo, e hoje vocês não mais os compartilham, então há uma enorme probabilidade de que a essa pessoa você não dispense a cortesia, a gratidão e a amabilidade que seria o lógico, por indução finita, dispensar!
E aí eu pergunto: será que o motivo é apenas o fato de já terem compartilhado lençóis e planos?
Não creio e mostro o porquê: geralmente, a "descortesia", o afastamento e até mesmo o "ódio velado" é muito mais pronunciado em uma das partes. Aliás, para ser preciso, no mais das vezes, um dos polos da relação sempre "sai de boa" e o outro, ressentido.
Minha brilhante amiga supramencionada diz que isso evidencia uma forma de "defesa" de uma das partes, assim como uma maneira de se mostrar que, ao final, venceu-se o "Jogo".
Eu concordo plenamente!
Acrescento ainda que, a meu ver, se trata de uma maneira de "vingança velada" geralmente manifestada pela parte que pretendia "manter a relação". 
Mas é nesse ponto que pretendo profundar o raciocínio.
E a "pedra-chave" é aquilo que chamamos "orgulho ferido". E essa chaga acomete o maior de todos os "pecados humanos" - a vaidade!
Em última análise, é por orgulho - que é um dos componentes da vaidade - que se presta a tão irracional e improfícua atitude!
E nesse ponto sou obrigado a tecer algumas análises que, provavelmente, desagradarão a alguns ainda voluntariamente submetidos aos caprichos escravizantes (e emburrecedores!) da vaidade.
Primeiro, a vaidade é um "pecado necessário" que, assim como uma droga fitoterápica, pode matar ou curar, dependendo da dose. Bem utilizada, transforma-nos em pessoas melhores, mais cultas, mais asseadas, melhor vestidas, mais educadas. Em excesso, transforma-nos em escravos de modismos, em seres arrogantes, vingativos e, pior: irracionais! E não custa lembrar que o que nos diferencia dos nossos primos que ainda sobrevivem no que resta de selvas, é o raciocínio lógico e a associação simbólica, essa muito mais que aquele!
Especificamente no caso em tela, o resultado do nosso orgulho, ou da má administração de nossa vaidade, é que:
1- Afastamo-nos de pessoas que, muito provavelmente fizeram mais por nós do que a maioria das demais faria ou fará um dia;
2- empobrecemos na teia de vínculos sociais, a tão duras penas construída num mundo em que abundam pessoas "toscas";
3- abdicamos do mais nobre dos sentimentos humanos: a amizade; e pior: por vezes nos socorremos de "pseudo-amizades" tão pobres que, em sã consciência, envergonhar-nos-iam;
4- vinculamos implicitamente o animus cooperandi ao animus domini, numa franca atitude de animus "fudendi";
5- e pior: "fechamos as portas" negligenciando irracionalmente a "máxima axiomática" de que "a vida vem em ondas", ou noutras palavras, que "a vida dá muitas voltas".

Como bons idiotas vaidosos, não somos capazes de nos colocar "acima" do condicionamento social, hipócrita e sectário, segundo o qual "a justiça tarda mas não falha" ou "a vingança é um prato que se come frio". Precisamos e torcemos para que uma "nova oportunidade" nos seja dada para que nos vinguemos, para que "saiamos por cima", seja lá o que isso signifique!
Animus domini, querer ser "dono", imperar sobre todas as coisas, querer ser o(a) melhor, porque somos únicos, perfeitos, e o mundo tem de ser nosso! A vaidade tornada dínamo, o orgulho como norte e a infelicidade como sina.
Infeliz contingência humana!
Quem sabe um dia retiremos do papel, das páginas de livros religiosos, dos discursos vaidosos travestidos de indulgentes, a essência da humildade e compreendamos, enfim, que as máximas ideológicas implícitas ou explícitas nas escolas, na TV, nos papos com os(as) amigos(as) - de que não devemos nos contentar "com parte", porque merecemos o "todo", porque somos perfeitos - "a imagem e semelhança do criador" -, porque "it´s now or never", porque "is my way or the highway", por que para nós é "oito ou ointenta", porque para nós é "tudo ou nada"; quem sabe um dia percebamos o quão infelizes e pobres têm sido nossas vidas por acreditarmos no que nos fizeram acreditar, porque nos insuflaram o orgulho e a vaidade para que, infelizes, fizéssemos o que todo "infeliz" faz: pensar pouco e consumir muito!

Um comentário:

  1. Muito bom e interessante o seu texto. O ORGULHO cega as pessoas, por meio do orgulho exacerbado, não tem como a pessoa orgulhosa enxergar os seus erros e assumi-los. Isso ocorre sempre em qualquer relacionamento, NENHUM escapa disso. Querem escapar, mas o ORGULHO não deixa. Principalmente quando há submissão de um em relação ao outro. Quem é o subordinado nunca tem nenhum orgulho, mas quem "manda" tem orgulho para os dois e nunca terá HUMILDADE suficiente para reconhecer. A indiferença é o remédio, pois não há sentimento pior que cause tanto sofrimento ao outro, do que a indiferença. A pessoa que sofre essa indiferença nunca pagará com a mesma moeda, tentará demonstrar aquilo que queria receber da outra pessoa, consideração. É assim com todo mundo e sempre será

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